‘Minha vida vai ser aqui’, diz auditora fiscal venezuelana que virou garçonete no Brasil

Jackeline Rivero era auditora fiscal na Venezuela e trabalhava em San Juan de Los Morros, distante cerca de duas horas de Caracas. Há cerca de um ano, ela buscou uma vida fora de seu país. Foi para Lima, no Peru, e há seis meses está no Brasil, onde trabalha como garçonete, em um restaurante de Natal.

Diante do quadro de fome que via em seu país, ela conta que buscou fugir da situação, mesmo tendo que mudar completamente o estilo de vida. Antes, ela conta, gastava o equivalente a R$ 800 diários com alimentação. Atualmente, vive com um salário mínimo.

A venezuelana conta que foi sincera, ao ser entrevistada para a vaga de emprego. “Eu disse que nunca servi ninguém, só em casa. Fui aprendendo. Às vezes, era engraçado, quase deixava cair as coisas nas pessoas. Acredito que de agora em diante minha vida vai ser aqui”, diz ela.

Com uma crise política e econômica e a fome de espalhando no país vizinho, muitas pessoas como Jackeline buscaram, pelos seus próprios meios, grandes centros urbanos no Brasil. Outros fazem parte de programas de interiorização, promovido pelo governo federal.

Em Caicó, distante 280 quilômetros de Natal, os venezuelanos foram acolhidos por um Organização Não Governamental. Na medida em que vão conseguindo emprego e condições de recomeçar a vida, outros vão chegando para ocupar o lugar deles no programa.

Uma placa improvisada na parede dá boas vindas aos estrangeiros. Para o mototaxista Edwin Jesus, porém, a mensagem mais acolhedora não veio com palavras e sim com um abraço.

“Faltava muito o abraço, porque, quando eu estava lá em Roraima, minha família estava na Venezuela, tinha muito tempo que uma pessoa não dava um abraço em mim. É uma coisa que emociona, porque em Boa Vista, como há muitos venezuelanos, o pessoal discrimina muito a gente”, lembra.

Edwin deixou a Venezuela em setembro de 2018 e andou a pé mais de 100 quilômetros até chegar a Roraima. Vendeu casa e carro para conseguir trazer a mulher, Tereza, e os três filhos para o Brasil. Atualmente, a família divide uma casa de três quartos, cedida pela Ong, com outra família venezuelana. As crianças estão matriculadas na escola e os pais, à procura de emprego.

“Necessitamos de algo melhor, um emprego para meu esposo e para mim, algo que nos ajude a superar para amanhã, quando tivermos chance de voltar à Venezuela, ter uma coisa melhor”, diz Tereza Ramos, que é cabeleireira.

Para ajudar na adaptação e na procura por um emprego, alunos e professores do curso de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) criaram um projeto voluntário e dão aulas de Português semanalmente aos refugiados. A professora Márcia Rejane conta que se emociona mais que os alunos, ao fim das aulas. “É tudo muito especial”, diz.