Haddad diz que deve divulgar nova regra fiscal em março e que BC deve evitar decisões baseadas em ‘ruídos’

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta quarta-feira (15) que o governo deve anunciar, já em março, a proposta de regra fiscal para controlar os gastos públicos federais em substituição ao teto de gastos, em vigor desde 2017.

“Nós vamos em março, provavelmente, anunciar o que nós entendemos que seja a regra fiscal adequada para o país”, afirmou Haddad durante evento promovido por um banco de investimentos.

Ele também avaliou que o Banco Central, responsável por fixar a taxa de juros para conter a inflação, não deve se “deixar levar” por ruídos para tomar suas decisões (veja mais abaixo nessa reportagem).

A PEC da Transição, aprovada no fim de 2022 para abrir espaço no orçamento deste ano e viabilizar promessas do novo governo, dava prazo até agosto para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a equipe econômica apresentassem essa proposta.

Em declarações desde então, no entanto, Haddad já previa antecipar a conclusão da proposta e o envio ao Congresso antes do prazo – o ministro falava em divulgar o projeto em abril.

Segundo Haddad, o pedido para antecipar ainda mais essa divulgação foi feito pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, com a concordância do vice-presidente da República e ministro de Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin.

“Estamos estudando há dois meses regras fiscais do mundo inteiro, documentos de todos organismos internacionais. Nenhum país do mundo adota teto de gastos”, afirmou o ministro da Fazenda.

 

Mercado aguarda nova regra

A apresentação de um novo mecanismo de controle dos gastos é aguardada pelo mercado financeiro porque o governo Lula precisará gastar mais dinheiro para cumprir promessas de campanha – entre elas, a retomada do Minha Casa, Minha Vida e de obras de infraestrutura pelo país.

Se esse aumento de gastos sair do controle, o país terá mais inflação e o governo terá que emitir títulos e aumentar sua própria dívida para financiar as despesas – o que aumenta o risco sobre os investimentos no país e afasta o capital estrangeiro, entre outros efeitos nocivos.

Recado ao Banco Central

O ministro da Fazenda também observou que houve uma deterioração das expectativas do mercado financeiro em relação a um mês atrás.

A piora na percepção dos analistas aconteceu após o anúncio do pacote para as contas públicas e, também, de ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à autonomia do Banco Central, ao atual patamar da taxa de juros (13,75% ao ano, o maior em seis anos) e depois de declarações sobre uma possível mudança da meta de inflação.

Haddad disse ainda esperar que o BC, responsável por fixar a taxa básica de juros, não se deixe levar pelo que ele chamou de “ruídos” na economia.

“Acho que a situação hoje é melhor do que a de um mês atrás, embora as expectativas estejam muito contaminadas por esse ruído todo. Eu sei que está, e lamento que esteja. E mais do que lamentar que esteja, eu lamento ainda se a autoridade monetária se deixar levar por isso. Não é esse o papel. Se deixar levar por ruído. Você tem que ir para o fundamento. Tem que ver o que está acontecendo de real. Você não pode tomar uma decisão com base na fantasia momentânea de um stress que pode acontecer.”, declarou o ministro.

No comunicado da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o BC subiu o tom ao incluir um cenário no qual os juros permaneceriam estáveis por mais tempo.

Na ata do encontro, a instituição indicou piora nas expectativas de inflação e se disse vigilante, mas reconheceu que o pacote fiscal de Haddad pode reduzir a pressão inflacionária.

Lojas Americanas

O ministro citou ainda o caso das lojas Americanas, varejista que enfrenta uma série de processos de investigação após o escândalo contábil reportado pela companhia no mês passado, quando descobriu “inconsistências em lançamentos contábeis” da ordem de R$ 20 bilhões.

De acordo com ele, o caso das lojas Americanas levou a um “stress” no mercado por conta de um “tombo” dado em 16 mil credores que chega a 0,5% do PIB (quase R$ 50 bilhões).

“Estamos aguardando até agora um pronunciamento. Cadê a solução? Tem que ter uma solução (…) Aquilo veio à tona por causa da taxa de juros [alta, que gera dificuldade de financiamento]. Você podia rolar mais três ou quatro anos aquela bagunça lá. Em algum momento, ia se perceber. De repente, a taxa vai de 2% para quase 14% [ao ano], o corpo boia né. O cadáver que estava lá no fundo do mar sobe e aí fica tudo exposto”, disse.

Haddad disse que, nesse caso, foi um problema de fraude. Mas questionou o que pode acontecer daqui a dois, seis meses, em referência aos juros elevados. “Será que aquele que se comportou direitinho, pagou seus fornecedores, registrou suas dívidas, será que ele vai suportar isso”, questionou.

Dicionário da crise: o que significam as expressões ‘teto de gastos’, ‘âncora fiscal’ e ‘Selic’

Fonte: G1