Entenda por que o preço da carne de porco deve subir 30% nos próximos 90 dias no Ceará

Enquanto a carne bovina e de frango acumulam altas desde o ano passado, a proteína de porco seguia uma trajetória contrária. Mas, após meses de quedas, o preço dos suínos deve voltar a subir.

De acordo com o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec), Amilcar Silveira, a expectativa é de uma alta de 20% a 30% no preço da carne de porco nos próximos 90 dias.

A alta vem para recuperar prejuízos do setor em meio ao aumento do preço da soja e do milho e à dificuldade de repassar os custos de produção ao consumidor devido a problemas de oferta e demanda. O aumento nas contas de energia também corrobora.

Carnes de aves e bovinos devem continuar a trajetória de alta que seguem desde o ano passado, motivados também por aumentos nos custos de produção.

Oferta e demanda 

Ao contrário das aves e bovinos, os suínos acumularam quedas no ano passado. Dados de março do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mostram uma queda de 5,29% do item no acumulado de 12 meses, enquanto aves e ovos tiveram alta de 18,88% e a alcatra, por exemplo, de 12,29%.

O fenômeno é explicado pela peste suína que aconteceu na China entre 2018 e 2019. O coordenador da pós-graduação em mercado financeiro e capitais da Mackenzie Brasília, César Bergo, detalha que o país teve que dizimar grande parte do rebanho devido à doença, passando a importar a carne de outros países.

“A China é não apenas o maior produtor de carne suína, mas também o maior consumidor. Então, desde 2018 e 2019, basicamente 60% do rebanho chinês foi eliminado, a China saiu comprando essa carne no mundo inteiro. Então, por mais que no último ano não tenha subido, em 2019 subiu bastante e acabou pressionando os preços dos demais itens”, coloca.

Com a demanda da China a produção de suínos aumentou em outros países, incluindo o Brasil. O preço do porco não seguiu o padrão da carne e do frango quando o país asiático regularizou a produção e diminuiu as importações, levando a um excesso de oferta.

A oferta se permaneceu constante e aqui no mercado brasileiro nós não temos o hábito de comer carne suína como lá fora. Então a demanda não foi aquecida, a oferta aumentou e o preço da carne suína conseguiu manter um padrão de preço muito próximo do que já era verificado”. Comenta César Bergo, coordenador da pós-graduação em mercado financeiro e capitais da Mackenzie Brasília
Amilcar Silveira explica que o Ceará não conseguiu manter os preços competitivos nem em relação a outros estados, já que os custos de produção eram mais altos para os produtores cearenses.
“A cadeia não estava bem organizada, está começando a se organizar mais agora. Basicamente as carnes vinham todas de fora, o custo de produção no Ceará para suínos é mais caro que em Santa Catarina, tínhamos que vender mais caro. Com essa luta, o mercado remunerou menor o suíno no Ceará”, diz.

Aumento nos custos de produção 

Ao mesmo tempo que os produtores suínos tinham dificuldade em liquidar a oferta em excesso, os custos de produção também começaram a subir.

Os insumos principais da carne suína são milho e soja. Milho custava R$ 37 [a saca] e hoje custa R$ 93, houve esse acréscimo muito grande. A soja era de R$ 70 a R$ 80 e agora é R$ 150, R$ 155. Com a pandemia, a China voltou a comprar soja, ela compra quase 70% da soja produzida no Brasil. Com isso encareceu, as pessoas passaram a exportar mais do que para o Ceará”. Diz Amilcar Siveira, presidente da Faec
No mercado há 30 anos, o suinocultor João Ricardo Rabelo conta que hoje os produtores não conseguem operar em lucro, diante do baixo consumo e dos altos custos.
“Hoje a atividade está empatando, não está dando prejuízo, mas não está dando lucro. Houve um aumento muito significativo dos insumos, que é o milho e o farelo de soja. Como a ração corresponde a 80, 85% do custo total de produção, isso impacta muito”, afirma.
Segundo Rabelo, o preço médio da carne do porco no atacado está em R$ 7 e, no varejo, em R$ 7,80. Enquanto isso, os custos de produção estão por volta de R$ 8.

Retomada dos preços 

Para evitar mais prejuízos, César Bergo acredita que os produtores devem diminuir a oferta em todo o país para conseguir elevar os preços. É o que deve acontecer, também, no Ceará.

“O produtor está tendo um prejuízo e se não melhorar vai cortar a produção. Se tiver um corte, vão subir os preços. Esse mecanismo é natural na economia, o produtor fica olhando o preço que ele consegue na indústria para ver se ele vai continuar produzindo ou não”, avalia.

Amilcar destaca que o aumento das despesas invariavelmente vai precisar ser repassado para o consumidor, principalmente com o reajuste de em média 24,88% na energia no estado.

Ele acrescenta haver uma mudança cultural que leva a um maior consumo da carne de porco. Isso também colabora para uma recuperação dos preços nos próximos meses.

“A gente está tendo uma campanha de marketing para estimular o consumo da carne suína. Estamos reduzindo matrizes para que os produtores não venham a ter prejuízos. Da porteira para dentro está se melhorando manejo e sanidade para que a gente se torne produtivo e tenha mais eficiência”, reforça João Ricardo.

Alta ainda não chegou aos frigoríficos 

Conforme diretora de um açougue na Aldeota, em Fortaleza, Giordana Thomezetti, os fornecedores ainda não sinalizaram sobre a alta nas proteínas suínas. Ela afirma que o último aumento aplicado foi no ano passado, mas o percentual foi tão pequeno que não foi repassado para os consumidores.

Todos os cortes suínos tiveram um aumento na procura por parte do consumidor desde o ano passado, diz Giordana. Segundo ela, todos os fornecedores de porco são de dentro do estado.

Em outro estabelecimento, localizado no Jóquei Clube, na Capital, também ainda não houve nenhuma indicação de aumento nos preços por parte dos fornecedores. Pessoa responsável pelo setor, que preferiu não se identificar, afirmou que os valores de hoje são os mesmos do ano passado.

“Não teve aumento, está tudo igual. Do meio do ano para o final do ano deu uma baixada com relação ao consumo. Mas do final do ano para cá não teve aumento”, garante.

Fonte: Diário do Nordeste